Há sempre UMA primeira vez…

E minha primeira vez na Ultra Maratona Atlântica foi no passado Domingo dia 28/7.

A cruzar a praia do Carvalhal – Foto da AMMA
Muito se fala e se escreve acerca da Ultra Maratona Atlântica Melides – Tróia, mas uma coisa é certa: é preciso passar por ela, sentir a areia nos pés, o mar a bater nas pernas, percorrer um metro a parecer-nos que corremos um quilómetro… é preciso participar para sentir e perceber todo o esplendor dos 43Km desta prova. 
E se mais fosse necessário para comprovar a espectacularidade e misticidade desta prova, basta contar o número de posts, comentários, fotos, etc., etc., que uma prova com um número reduzido de participantes (460) gerou entre Domingo e hoje nas diversas redes sociais.

Se esta prova era UMA ideia quejá não me saía da cabeça desde Fevereiro/Março, depois de participar nela só posso acrescentar que fiquei fã e que em 2014 lá estarei de novo (se não existirem percalços de maior até lá).

Depois de decidida a participação na UMA e de concluída a participação na Maratona do Luxemburgo, dei início à preparação propriamente dita, com o plano de treinos possível para as sete semanas que separaram estas duas provas. Treinos na areia foram apenas cerca de 100 Km nas areias da Costa da Caparica e do Meco. Não foi muito nem pouco foi apenas o suficiente para perceber que a prova ia ser dura, e que não seria possível para mim fazê-la em cerca de 4 horas como as anteriores maratonas. 
Estabeleci como objectivo principal terminar a prova, objectivo este que tinha a certeza de conseguir, e objectivo secundário fazer um tempo entre as 5h e as 5h30, objectivo que irei depender de muitos factores externos e que apenas saberia ser ou não possível de atingir quando começasse a correr.

Com os companheiros ACCVCAVI Vargas e Bruno nos preparativos para a partida
Até ao dia da corrida muita coisa se passou. Li e reli os textos do Fernando Andrade que já anteriormente me tinham feito apaixonar por esta prova, os do Luís Parro, e mais uns quantos de outros blogs que vou acompanhado, talvez na esperança vã de encontrar a luz que me guiasse nas escolhas certas para a minha primeira UMA. Uma conclusão era certa, pelo menos nos últimos 10 anos não aconteceram duas corridas de características iguais e sei agora que a deste ano também não fugiu à regra. Mas foi assim com opiniões daqui e a dali que escolhi o meu equipamento e decidi a minha táctica de corrida, opções que (sei agora), foram ambas erradas.

Domingo, dia da prova, dia de mais um erro cometido. Acordar às 4h da manhã para começar a correr às 9h, foi manifestamente um erro. Dormi cerca de 3h e participar numa prova com estas características de resistência sem uma boa noite de sono/descanso é um belo disparate.
Dei boleia ao Bruno e encontramo-nos com o Vargas na área de serviço do Seixal perto da 5h da manhã. A viagem até Setúbal foi tranquila e em amena cavaqueira, até apanharmos o catamaran que nos levou até Tróia na outra margem do Sado. À saída do barco fui entrevistado pelo pessoal da ETIC, vídeo que mais dia, menos dia deverá aparecer aqui pelo blog. Aí apanhamos o autocarro que nos levou até Melides, e numa curta viagem aí estávamos nós no local da partida para esta aventura. Deveriam ser cerca das 7h30 quando chegámos a Melides, mas o tempo passou num abrir e fechar de olhos até à hora da partida. Entre levantar o dorsal, equipar, cumprimentar todos os amigos e conhecidos que vamos encontrado, verificar pela 639ª vez o equipamento, ir à casa de banho, ver o estado da areia, etc., etc, essa hora e meia esfumou-se.

Aqui com o apoio incansável da Marta e do Daniel – Foto AMMA
Chegou a hora da partida e dirigimo-nos para zona da largada. O Campeão Olímpico Carlos Lopes disparou a pistola e aí fomos nós mais os outros 457 em direcção a Tróia. E só já nos separavam da chegada 43Km menos uns metros.

A minha táctica de corrida passava por correr em linha recta e junto à linha de água os primeiros 10 a 18 Km da prova (reconhecidos por todos como os mais difíceis), onde tradicionalmente a areia é fofa e não ajuda a progressão de pessoas mais pesadas como eu. Por outro lado junto à linha de água, a areia é mais inclinada mas supostamente seria menos mole. Por isso optei por correr com uma sandálias Rockland Hawaii, de modo a correr “com os elementos”, uma vez que estas sandálias permitiam a circulação da areia e da água sem incomodarem a minha corrida.

Já perto da meta com o Luís, Andreia, Ricardo, Elisabete e Paulinha – foto AMMA
A cerca de 10 metros da meta 🙂
Passada uma centena de metros dirigi-me para perto da linha de água, e lá chegado percebi passada outra centena de metros que a primeira surpresa tinha chegado: a maré estava cheia, (o que não era surpresa), mas estava também “viva”, esta sim a surpresa do dia! Assim em cada seis ondas, cinco vinham com uma rebentação normal que pouco ultrapassava a altura dos tornozelos, mas a seguinte vinha com uma força e altura que frequentemente chegava à minha cintura e que assim me obrigava a abrandar e a parar. Por outro lado a ondulação tinha produzido umas dunas malandrinhas que faziam um carrossel de sobe e desce para quem corria junto ao mar. Insisti durante uns longos 4 a 5 km em cumprir esta táctica, mas verifiquei (talvez tarde de mais) que este não seria o dia para a utilizar. Dirigi-me assim para o topo da duna, onde a areia mole reinava, mas felizmente estava preparado mentalmente para mudar de tácticas e improvisar as vezes que fossem necessárias. Continuei num ritmo lento na esperança que a areia mole desse lugar a uma areia mais sólida dali a mais 5 ou 6 Km para finalmente começar a “correr”. Esperança vã, uma vez que a areia mole durou, durou e durou, até muito perto dos 18 Km. Eis que por volta do Km 12 a Marta Andrade e o Daniel Ramos que tinham prometido ir apoiar durante a corrida apareceram e ajudaram-me a aumentar um pouco o meu ritmo até perto da Praia do Carvalhal. Foi uma ajuda preciosa e uma boa companhia que muito agradeci durante aqueles quilómetros. Entretanto e como a areia mole não terminava, decidi experimentar correr descalço uns quilómetros, o que se revelou uma excelente opção. Fui descalço até perto do Km 31, altura em que a areia estava agora mais dura. Decidi calçar novamente as sandálias e que bem que me soube. 


A combinação do calçado e da areia dura fez efeito e acelerei para um ritmo pouco mais rápido que 6 min/km. Passei pelo Miguel Pinhal que queria bater o seu record pessoal e tentei que viesse atrás de mim, mas já não conseguiu. Pensei para mim, vamos lá fazer jus ao dizer “a maratona é uma corrida de 10 Km que começa aos 32” e vamos meter um ritmo de corrida nestes quilómetros finais. Ainda estava com estes pensamentos e passados 3 Km mais uma zona de areia mole e cheia de algas. 
O segundo objectivo estava há muito perdido, e restava-me chegar ao fim com dignidade. Meti um ritmo mais lento de cruzeiro e assim fui até ao Bico das Lulas em Tróia, onde se encontrava a meta. Há minha espera estavam o Bruno e o Vargas que já tinham terminado há cerca de 1h15 atrás, e uma série de amigos que me foram apoiar nesta prova. Ainda tive a presença da minha mãe que cruzou a meta comigo, eufórica como se eu tivesse ganho a prova!
Um abraço especial à chegada
No final foram 43,2 Km de areia, percorridos em 6 horas e 47 minutos, mas sempre com muito boa disposição e um sorriso na cara. No final tinha a certeza que para o ano lá estarei de novo, e para melhorar o tempo desta estreia.

Quero agradecer a todos os amigos que me desejaram boa sorte e que de uma maneira ou de outra, estiveram presentes no apoio a esta minha estreia nas Ultra Maratonas. Em particular agradeço à Voni, à Joana, à Gabi, à Paula, à Isabel, à Elisabete, à Andreia, à Rute, ao Ricardo, ao Luís, à Jica, e à minha Mãe, pelo apoio em diferentes momentos da prova. Um agradecimento muito especial para a Marta e o Daniel que me acompanharam por longos quilómetros, e que ficaram com o bichinho da UMA atrás da orelha, (para o ano vamos todos juntos). E por fim agradeço a três loucos que, mesmo dizendo cobras e lagartos, se deixaram contagiar pelo meu entusiasmo e que se vieram estrear na Ultra Maratona Atlântica comigo: o Bruno, o Vargas e o João Campos.

Quem quiser consultar o registo da minha prova pode fazê-lo clicando aqui.

ACCVCAVI por ordem de chegada (ou talvez não) 😀
Um abraço, bons treinos e melhores corridas!!!

Sobre mim…

Chamo-me Nuno Gião e sou um atleta de pelotão que gosta de correr longas distâncias. Se há uns anos atrás me tivessem dito que ia correr uma meia maratona eu chamaria louca a essa pessoa. Imaginem se me dissessem que em 2014 iria correr uma prova 100 Km... Actualmente corro Ultra Trails, participo em desafios de endurance na natureza e é sempre uma enorme satisfação que cruzo as mais fantásticas paisagens. Tento superar os diversos desafios a que me proponho. A vida é demasiado curta e bonita para ser desperdiçada sentado num sofá.

6 Comments

  1. Excelente relato, Nuno. E obrigado pela referência aos meus. E como é bom de ver, estes textos têm uma mesma carga emotiva associada ao esforço físico e psicológico de quem viveu a aventura. Obrigado pela partilha e bem vindo ao mundo apaixonante da UMA, uma prova verdadeiramente épica.
    Abraço.

  2. 30/07/2013
    Reply

    Obrigado Fernando, eu é que agradeço não só os relatos da UMA mas também todas as experiências proporcionadas na Meia da Lampas, treinos associados e afins. 😉
    Um abraço

  3. 31/07/2013
    Reply

    Obrigado por lançares o desafio, para o ano voltamos com outra táctica igualmente má 😉

  4. Parabéns pela prova Nuno! Excelente relato de quem viveu o desafio com emoção. Uma descrição completa.
    Abraço.

  5. […] Para quem sente que correr na praia é a sua praia, existe também a Ultra Maratona Atlântica, uma Ultra Maratona de 43 quilómetros que liga Melides a Tróia sempre pela praia. Foi nesta prova que me estreei nesta coisa das Ultras Maratonas, e cuja história podem ler ou reler clicando aqui. […]

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