Esta maratona, a XXX de Sevilha, não foi tão bem preparada em termos de treino como outras do ano passado, mas longe estaria eu de pensar que me fosse correr tão mal.
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O dorsal e a medalha final |
Dias antes dizia eu meio a brincar que o objectivo era fazer melhor que a estreia no ano passado, e a realidade é de que esse foi efectivamente o único objectivo conseguido. Em termos práticos tirei 14 minutos ao tempo da Maratona de Sevilha de 2013, mas também fiquei a 18 minutos do meu melhor tempo na maratona, obtido no Porto há três meses atrás.
A minha mente estava consciente de que o treino não tinha sido o melhor e que dificilmente iria bater as 3h44 do Porto, mas o objectivo íntimo seria conseguir algo entre as 3h45 e as 3h55, conforme o que fosse sentindo durante a corrida. Aliás essa era a única estratégia que tinha delineado para esta prova: ir correndo dentro das minhas possibilidades conforme me fosse sentido.
Acordei bem-disposto com o despertador às 6h00 e tomei o pequeno-almoço dentro do habitual em dias de corrida. Fui para a zona da meta na esperança de encontrar muitos dos amigos que também estavam em Sevilha para correr a maratona, mas acabei por me cruzar apenas com um ou dois, no meio da enorme multidão de atletas, cerca de 9000. Acabei ficando com o José Santos para a partida, o qual fez o favor de desaparecer assim que a prova começou, tal era o ritmo a que ia, bem forte de mais para as minhas pernas. Este malandro acabou por terminar com 3h14, um excelente resultado. Parabéns Zé! Voltando à minha corrida, lá fui os quilómetros iniciais sozinho e num ritmo razoável, cruzando-me aqui e ali com algumas caras conhecidas. Aos 2 Km passou por mim o balão que indicava 3h00. Aquele não era de todo um ritmo para mim e não foi nada que me deixasse preocupado. O balão que indicava 3h30 também passou por mim entre os quilómetros 9 e 10 o que também não me deixou preocupado, pois não era esse a meta que tinha destinado para mim. Por esta altura também passo pela Ângela Costa que está a comentar com o Rui Alegre: “…não vem ninguém para as 3h30…” e nem me viram passar por eles! Serviu para me ir a rir divertido até uns metros mais à frente onde estava a minha mãe a apoiar-me com a bandeira de Portugal com o meu nome. Mais um forcing e mais uns metros corridos, e entretanto cruzo o check point dos 10 Kms em 00:51:49, o que dava um ritmo médio de 5:11/km e uma estimativa de terminar abaixo das 3h40. Ia bem, sentia-me bem, mas sem nunca me esquecer da velha máxima da maratona: se te vais a sentir cansado abranda, se te vais a sentir bem abranda. Ia eu com estas contas e pensamentos, e começo a ouvir atrás de mim: “Embora Nuno Gião, chegou o balão das 3h40”; e lá vinha o Luís Boleto com mais uns amigos a correr para as 3h40. Não foi preciso insistirem muito e lá fui com eles. Afinal o ritmo que levavam era igual ao meu e eu até estava tranquilo e a sentir-me bem, e assim fui com eles até ao quilómetro 20, altura em que o Boleto acelerou mais um pouco e não consegui acompanhar o ritmo. Ainda assim ia completamente dentro do ritmo para as 3h40. Passo a meia maratona e recebo o primeiro sinal do que estaria para vir. Estava algum calor, bebia sempre um pouco de água em todos os abastecimentos, mas parecia que a água que bebi não circulava e acabava por se acumular no intestino. Comecei aqui a sentir dores de barriga, que incomodavam o suficiente para não conseguir manter o ritmo que levava até então. Na Maratona de Lisboa já tinha padecido de um problema análogo. No entanto após 3 ou 4 quilómetros a correr e a conseguir libertar uns “gazes” pelo caminho essas cólicas passaram e consegui ir até ao fim sem parar. Estava na esperança que desta vez o processo fosse igual, no entanto estava difícil de conseguir libertar o tal “gás”. Por volta dos 22/23 Km fui apanhado por dois amigos do Banif/Açoreana que iam no grupo inicial com o Boleto e que entretanto tinham ficado para trás. Fui com eles mais uns quilómetros até perto do Km 25, mas as dores de barriga não só não passavam como teimavam em aumentar, pelo que decidi abrandar mais um pouco para acalmar a “tripa” e decidi que iria tentar ir à casa de banho que existiria no quilómetro 30. A decisão de parar durante uma corrida por um motivo tão estupido como ir aliviar a tripa é sempre uma decisão muito difícil, pelo que entre o quilómetro 25 e o 30 não sei o que me custou mais, se aguentar correr sem me infligir estragos maiores ou ter de decidir “mesmo” parar aos 30 quilómetros. Foi assim nestes pensamentos, que após 2h41 de corrida cruzo o check point dos 30 Km olho para a direita, observo que a casa de banho até está livre e decido entrar.
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Quase no fim, a chegar ao Km 38. Foto do Rui Alegre. |
Interlúdio
Pertenço ao grupo de pessoas que muito dificilmente utiliza uma casa de banho que não seja de “confiança”, mas já por meia dúzia de vezes tive usar por motivo de força maior estas casas de banho químicas que disponibilizam antes e durante as provas. Ainda assim sou esquisito e tento encontrar uma que esteja mais decente que as outras. Tinha chegado não um motivo de força maior mas ante “o” motivo de força maior, e a escolha era reduzida a uma opção pelo que entrei na opção disponível. Primeiro (e estupido) pensamento: “o gajo que vier a seguir vai pensar que fui eu que caguei isto tudo”, tal era o estado do meu predecessor que nem sequer conseguiu acertar no buraco, digamos de tamanho normal, onde qualquer pessoas normal se sentaria normalmente. Estes WC também são denominados de WC químicos, e se calhar o tipo, apesar da altura considerável que vai
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Maratona dentro da maratona… |
entre a sanita e os “químicos” propriamente ditos, deve ter medo que algum calhau caia com mais força, provoque uma onda, e os químicos lhe acertem em algum local mais sensível… Pensamentos estúpidos ultrapassados, foi altura de baixar o calção e fazer uma ginástica para em semi agachamento ter melhor pontaria que o palerma anterior. Entretanto a cabine do dito WC começa a abanar e por momentos, pareceu-me que estava a fazer surf, com os calções nos tornozelos e que aquela porcaria que se ir virar a qualquer momento. Aí é que a merda se ia mesmo entornar!… Calções nos tornozelos, pontaria afinada, e não é que as dores de barriga que me incomodaram fortemente nos nove quilómetros anteriores não queriam expelir nada de nada, nem um gaz mínimo para amostra e que justificasse tão incómoda paragem?! Foram 2 ou 3 minutos assim, e decido desistir, vou agacho-me mais um pouco para puxar os calções para cima e voilá a magia aconteceu! Aconteceu mas foram artes mágicas lentas. Foi uma eternidade de 5 ou 6 minutos até libertar toda a magia que havia em mim. Abro a porta, saio do WC dito químico, entra outro aflito para o meu lugar. Imagino que o gajo pensou: “Este cab&%# cagou isto tudo”, mas a culpa não foi minha…
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De volta à corrida já com esta definitivamente estragada, mas bem mais leve apesar de ainda com um incómodo no intestino, tentei recuperar o ritmo que levará até aos 30 Km. Se lá conseguisse chegar de novo, ainda terminaria a prova com menos de 4h00, o que não sendo bom, seria uma boa marca com tanta peripécia pelo meio. O relógio aponta novamente 5:11/km de ritmo, mas a tripa começa a dar novamente sinal agraste. Abrando o ritmo e a tripa abranda o seu sinal comigo. Andámos os dois neste jogo por mais uns quilómetros, mas sempre que bebia mais águas, as cólicas aumentavam de novo, e decidi que a tripa vencesse esta batalha, mas não iria de certeza vencer a guerra. Anuí em baixar o ritmo para níveis que nem tinha pensado antes da prova, cheguei mesmo a parar por 4 ou 5 vezes para fazer alguma ginástica abdominal, mas fui correndo até ao final. Chegado ao fim do quilómetro 41, cancelei todas as negociações que existiram até então com a tripa, e acelerei até à meta, terminando os 200 metros finais já na pista do Estádio Olímpico com um sprint forte para mostrar à tripa quem é que manda. No final terminei com 4h02:20, descontando os cerca de 7 minutos que estive na box, daria um tempo líquido na casa das 3h55 o que face às circunstâncias nem foi mau.
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Resultados parciais e final |
Em resumo e mesmo com esta casualidade menos boa, foi uma boa corrida, muito animada, com público a assistir, a aplaudir e a incentivar os atletas do início ao fim da prova, e que continua com uma relação qualidade/preço muito muito boa, face a toda a organização com que somos presenteados.
Não correndo o risco de me esquecer de alguém, quero agradecer e dar os parabéns a todos aqueles com que partilhei treinos e momentos na preparação para Sevilha e que estiveram igualmente este Domingo em Sevilha para correr ou só para acompanhar outros atletas. Um abraço especial ao Camané, ao João Veiga e ao Pedro Pisco, que cumpriram mais uma jornada com tempos canhão, com 3 horas e 7, 14 e 20 respectivamente.
Continuação de bons treinos e de boas corridas!!!
Next stop: 50 Km do Ultra Trail do Piodão
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