XI Maratona do Porto

Há corridas assim, que têm tudo para correr mal e acabam correndo muito bem, ou como diria o meu amigo Vargas, das piores tocas saem os melhores coelhos. Assim foi com a XI Maratona do Porto.

Decidi efectivamente participar na maratona do Porto na Sexta-feira, dois dias antes da prova. Inicialmente a minha participação seria para se resumir a fazer um treino mais longo e fazer de lebre e dar algum suporte a uma amiga que se ia estrear na distância da maratona. Uma lesão de última hora impediu esta minha amiga de participar, ficando eu com a indecisão nas mãos acerca de participar ou não, e depois decidir em que moldes iria fazê-lo. O meu plano de treinos apontava para dois treinos de duas horas neste fim-de-semana, e uma vez que no Sábado a minha agenda estava preenchida profissionalmente decidi mesmo participar na maratona no Domingo. Tomada a decisão de participar defini como objectivo para esta corrida rolar e tentar manter o ritmo de 5:13/Km. O meu principal objectivo é a participação nos 80K do Arrábida Ultra Trail no próximo dia 16, pelo que esta maratona teria forçosamente de ser feita a um ritmo confortável, para não causar um desgaste excessivo que fosse impossível de recuperar em duas semanas. Assim sendo, apesar de há alguns meses não efectuar treino específico para provas de estrada e 5:13/Km ser um ritmo para bater o meu recorde pessoal na distância, com o planeamento e alguma qualidade dos treinos que tenho realizado para as provas de trilhos, pareceu-me um objectivo perfeitamente alcançável. Foquei assim o objectivo em chegar ao fim em 3h40 tirando 4 minutos ao meu anterior melhor.

A boa disposição antes da partida com o Miguel Baptista e o Nélson Marques

Alguns dos rituais que costumo cumprir para estas provas de estrada, ficaram por cumprir. Não encontrei os pensos para o nariz, que me ajudam efectivamente a respirar melhor, e sobretudo esqueci-me de comprar fita anti bolhas para colocar nos dedos dos pés e evitar assim alguns danos colaterais como as famosas unhas negras. Não havia tempo útil ou oportunidade para corrigir estas falhas, pelo que me dirigi para a partida sem pensar muito nisso e disposto a correr sem que tal me afectasse.

A zona da partida da Maratona do Porto é sempre uma festa dentro da festa. Muitas caras conhecidas, muita troca de palavras de motivação com os muitos amigos atletas, muitas fotos e uma enorme nuvem de boa disposição a pairar no ar.

A manhã estava fresca, o sol escondido atrás das nuvens só espreitava esporadicamente, pelo que estava uma excelente manhã para correr. Chegaram as 9h00, soou o tiro de partida e lá fui eu para a minha sétima maratona de estrada. Sentia-me bem e tentei manter um ritmo mais rápido do que o previsto inicialmente para não incomodar muito os aceleras que partiram comigo do bloco A. Quando dei por mim estava a correr a menos de 4:55/Km e continuava a sentir-me muito bem. É certo que ainda só tinha corrido pouco mais de dois quilómetros, mas era um bom prenuncio para o resto da corrida. Entretanto deu-me uma vontade de fazer um xixi. Não era uma necessidade urgente e que me obrigasse a parar, mas antes daquelas vontades pequeninas, que se vão sentindo e que apenas se vão tornando incómodas ao longo do tempo. Mais uma decisão a tomar: parar agora que me sentia bem e libertar-me daquela sensação incómoda, ou esperar mais uma dezena de quilómetros até ser verdadeiramente urgente a necessidade e eventualmente ser mais difícil retomar o ritmo que levava. Optei por parar logo e resolver este assunto. Uma paragem breve, de três dezenas de segundos, mas que pareceram horas e que me fizeram ver afastar o pelotão que seguia o balão das 3h30 onde eu me inseria até então. Feito o xixi retomei o ritmo que me embalava desde o início, abaixo de 5:00/Km, e continuei em direcção a Matosinhos onde cruzei os 10 Km em pouco mais de 50 minutos. Aproveitei a mudança de direcção para a Foz e a descida que aí existia, para acelerar um pouco e ajudar a manter o ritmo abaixo dos 5:00/Km. Por volta do Km 14 o Paulo Taboas chegou-se perto de mim. O seu objectivo era fazer 3h30 e como ia mais ou menos nesse ritmo podíamos ajudar-nos mutuamente. Infelizmente uma mazela reincidiu novamente no seu tornozelo e apenas conseguimos rolar juntos por cerca até perto do Km 17, onde eu continuei e o Paulo teve de abrandar um pouco o ritmo.

Chegado à Foz lembrei-me do Tenente Vilaverde, da sua amada Luísa e de Sebastião Moncada, que terá pernoitado numa estalagem da Foz do Douro nos idos de Junho de 1832. Perguntam-me tantas vezes no que se pensa quando se corre 4, 5, 6 horas seguidas… Dá para pensar em tudo! Neste caso deu para pensar na sorte de alguns dos personagens de um romance que ando ando a ler por estes dias, e que se situa precisamente no Porto por altura das guerras liberais.

 

Segui até à meia maratona, marco que cruzei com 1h44 de prova, altura em que o primeiro queniano cruzava a estrada no sentido contrário já no seu Km 36!!! Continuei a minha prova e atravessei a Ponte D. Luis, passando o cais de Gaia em direcção à Afurada, onde o meu amigo Fernando Pinho lá estava a dar o seu tradicional apoio aos atletas e a filmar as nossas figuras tristes. Um grande abraço para ele.

O percurso da Ponte D. Luis à Afurada e regresso são aproximadamente 9 Km, entre os quilómetros 24 e 33 e foram para mim a pior parte de toda a prova. Por um lado grande parte do percurso é de paralelepípedo o que obriga a fugir para o passeio para não dar magoar tanto os pés, por outro lado foi um trajecto em que quer na ida quer na volta me cruzei com muitos atletas amigos, e os acenos e/ou as trocas de palavras motivacionais que se fazem, fizeram-me perder um pouco o foco na corrida e consequentemente perder um pouco o ritmo constante que levava até então. Na volta da Afurada, perto do Km 28, ainda houve lugar a uns metros de loucura e pura insanidade. O Rui Pedro Julião que foi fazer de lebre a um amigo nesta maratona e até então tinha vindo lá mais para atrás, passou por mim no seu ritmo normal de 3:50/km e gritou “Nuno cola-te a mim e anda”, e eu bem mandado, e aproveitando que era a descer lá fui atrás dele… loucura que durou durante 10 ou 15 metros, altura em felizmente percebi a insanidade do acto que estava a cometer e me remeti ao meu ritmo de corrida.

A chegar à meta e a fugir do Nélson Mota 🙂

Cruzo novamente a Ponte D. Luis e fico satisfeito por só faltarem 9 Km para chegada. Continuava a sentir-me bem, o ritmo estava controlado, e o objectivo que tinha definido para a corrida só não seria batido se acontecesse algum azar. As minhas dúvidas nesta altura da corrida eram entre seguir forte e tentar baixar as 3h30, ou manter um ritmo mais tranquilo e chegar ao fim com um menor desgaste. A decisão a tomar foi rápida: acalmar e chegar ao fim com um menor desgaste. Apesar do bom desempenho com que a prova se desenrolava o meu objectivo continuava a ser treinar para o AUT, não fazia assim sentido desgastar-me muito mais mantendo um ritmo mais forte, sabendo que vou necessitar de todos os meus recursos dentro de quinze dias. Por outro lado estava a utilizar um dorsal cedido pelo meu amigo Vargas, pelo que o resultado oficial também não ficaria no meu nome próprio, o que feitas as contas também ajudou à decisão. Decidi assim acalmar, relaxar um pouco as pernas e seguir perto dos 5:13/Km a que inicialmente me tinha proposto para terminar algures perto das 3h35. Tudo ia tranquilo até que algures perto do Km 41 passa por mim o amigo Nélson Mota todo contente e a chamar por mim. Deu-me um avanço de cerca de 100 e poucos metros e entretanto pensei: “já o ano passado este #$%&=% (amigo) passou por mim no final, este ano não pode ficar assim…”. Fui a marcá-lo à distância até à curva para a subida final para a meta, onde sei que nesses cerca de 1200 metros finais muitos atletas abrandam o ritmo naturalmente com a subida. Quando comecei a subir acelerei o ritmo e apanhei novamente o Nélson em poucas centenas de metros. Aí chamei eu por ele, “Anda Nélson só faltam 600 metros”, liguei o turbo novamente e tencionava ir até ao fim assim, quando a 200 metros da meta apanho o Miguel Baptista que tinha iniciado a prova para tentar as 3h15. Ia já em dificuldade e abrandei para puxar por ele, “Anda Miguel que só faltam 200 metros”, mas ele já não dava mais e lá segui de novo até a meta ultrapassando mais meia dúzia de atletas nos metros finais. Cruzo a linha de chegada nas 3h33’59”, sendo o tempo líquido de chip 3h33’44” um novo recorde pessoal onde tirei quase 11 minutos ao meu anterior recorde. A história não se repetiu e este ano cheguei eu à frente do Nélson por uns segundos.

Chegado ao fim da Maratona do Porto fiquei muito satisfeito com o meu desempenho. Controlando sempre o ritmo e não esforçando nada em demasia, consegui correr abaixo dos 5:00/Km cerca de 32 Km e terminei os 42 Km com uma média de 5:04/Km, bem abaixo dos 5:13/Km que tinha previsto inicialmente.

No final as fotografias da praxe, a medalha, a jola, a t-shirt de finisher e a garrafa de vinho do porto, foram a recompensa para uma bela manhã de exercício.

Como ponto menos positivo os duches que a organização disponibilizou para a prova: Um único chuveiro para mais de 4000 atletas da maratona e a cerca de 1500 metro da chegada. Pergunto eu, se metade dos 4000 atletas decidissem tomar duche logo ali, como é que seria e que imagem passaria para o exterior desta organização? Esta é a prova de que mesmo em organizações consideradas como boas, existem sempre processos e aspectos passiveis de melhoria.

Para fim de festa houve lugar à tradicional francesinha para recompor do esforço da corrida.

Desta vez o Vargas tinha razão, a toca não tinha bom aspecto mas saiu de lá um belo coelho.

Continuação de bons treinos e de boas corridas!!!

Sobre mim…

Chamo-me Nuno Gião e sou um atleta de pelotão que gosta de correr longas distâncias. Se há uns anos atrás me tivessem dito que ia correr uma meia maratona eu chamaria louca a essa pessoa. Imaginem se me dissessem que em 2014 iria correr uma prova 100 Km... Actualmente corro Ultra Trails, participo em desafios de endurance na natureza e é sempre uma enorme satisfação que cruzo as mais fantásticas paisagens. Tento superar os diversos desafios a que me proponho. A vida é demasiado curta e bonita para ser desperdiçada sentado num sofá.

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